segunda-feira, 19 de novembro de 2012

Pavimento de concreto permeável Hydromedia: Ainda por cima é bonito!

 

 
“Conforme previsto, um temporal atingiu Belo Horizonte no começo da noite desta quinta-feira. A Coordenadoria Municipal de Defesa Civil (Comdec) chegou a emitir alerta de pancadas de chuva forte acompanhadas de rajadas de vento e descargas elétricas. O que não era estimado é que a chuva provocasse tantos transtornos na capital mineira. Choveu mais que o dobro do esperado e a situação se tornou caótica em várias regiões da cidade. Houve vários pontos de alagamento ou risco iminente de inundação. Carros foram arrastados pelas águas e pessoas ficaram ilhadas. Em uma das inundações, um homem morreu dentro do próprio veículo arrastado no Bairro Castelo. Quedas de árvore obstruíram o tráfego de veículos em alguns bairros e houve interrupção no fornecimento de energia elétrica. Pelo menos uma casa desabou na capital. Cidades vizinhas também foram castigadas.”


Esta é uma passagem da reportagem que pode ser lida no site do “O Estado de minas” (www.em.com.br), a respeito da chuva no feriado de 15 de Novembro último. Ela vai encimada pela fotografia abaixo, tirada na Av. Cristiano Machado, próximo ao Minas shopping. Vários amigos meus também postaram nas redes sociais fotos e vídeos de outros trechos alagados da cidade, a maior parte deles com críticas à prefeitura ou à falta de educação de quem joga lixo na rua.


 
 
De fato, o poder público pode fazer muito para minimizar este problema e evitar mortes como a do homem da reportagem. E também aos cidadãos cabe uma parte da responsabilidade de evitar mais tragédias, mantendo a cidade limpa e, consequentemente, os bueiros desobstruídos. Mas quem se lembra do nome de outro vilão, também bastante alardeado por aí? Isso mesmo a Engenharia. Nós, que ao contribuir para o crescimento da cidade, modificamos radicalmente o regime hidrológico da região onde a cidade se assenta. Impermeabilizando o solo e canalizando a água da chuva, para escoadouros nem sempre bem dimensionados. Mas como evitar? Precisamos de áreas de estacionamento, de circulações para pedestres, de moradias populares, de espaços públicos de lazer, etc, etc, etc... Somos cada vez mais numerosos e exigentes e gostamos de pisar no concreto para facilitar o fluxo do dia a dia.


Por isso que eu e outros colegas ficamos tão empolgados com a tecnologia do concreto permeável que conhecemos, através de um produto chamado “Hydromedia”. Lá na companhia a previsão de início das pesquisas neste campo era apenas para o ano de 2013, mas nós acabamos nos antecipando, diante do imenso potencial que todos perceberam. Trata-se de um concreto que permite a passagem de 100% da água incidente sobre ele, apesar de oferecer resistência e capacidade de suporte para o tráfego de pessoas e veículos de passeio. É um concreto bastante fluido e adaptável a áreas de qualquer dimensão e formato. Isso cria dois campos correlatos bastante interessantes: O uso como parte integrante de soluções completas em projetos de drenagem, ou simplesmente como um concreto que não altera as propriedades drenantes naturais do solo abaixo dele.
 

 
Display no laboratório onde trabalho
 

Assim, o Hydromedia pode vir a ser facilmente reconhecido como uma alternativa para uso em áreas de permeabilidade obrigatória nas edificações e, porque não, mesmo em locais livres de legislação, onde o concreto normal seria aplicável. As versões mais atuais dos traços em que estou trabalhando têm uma velocidade de percolação de água de cerca de 350 L/m2*min e é 25% mais leve que o concreto comum. Apesar disso, tenho obtido resistências superiores a 20,0 Mpa na compressão diametral e 3,0 na tração à flexão! Isso faz dele um concreto perfeitamente adaptável em projetos de pavimento de baixa solicitação, figurando como fck 15,0 e fctm,k 2,0 Mpa. No ensaio de desgaste WTAT, realizado em parceria com a SOLOCAP (Obrigado ao amigo Cristiano, também diretor de divulgação da Associação Brasileira de Pavimentação), o Hydromedia não apresentou perda de massa apreciável. No Pendulo Britânico foi classificado como uma superfície de boa rugosidade para evitar derrapagens de veículo.
 

 

Além da enorme velocidade de percolação da água, outra propriedade interessante é a capacidade de retenção de água dentro da massa de concreto, como me chamou a atenção outro dia meu amigo Rodrigo. Isso faz com que um pavimento de Hydromedia funcione como um reservatório de água, evitando a formação de poças d’água e dando tempo para que a evaporação e absorção do solo consumam com a água. Um pavimento de 10 cm de espessura, por exemplo, é capaz de conter uma lâmina d’água de até 3 cm. É o suficiente para permitir que você desça do carro com o sapato seco depois de uma chuva torrencial, mesmo se o solo abaixo for totalmente impermeável.


E se as vagas de garagem dos estacionamentos de todos os supermercados fossem feitas de Hydromedia? E as calçadas no entorno das avenidas maiores? E as praças com playground e aparelhos de ginastica? O Arcindo, presidente da nossa ABESC, outro dia me disse que um dos sonhos dele é que as ciclovias das cidades fossem feitas de concreto permeável: Mais “grip”, menos calor e ainda por cima sustentáveis!
 
 
 
Mas o mais engraçado é que até agora a maioria das aplicações que eu presenciei foi inicialmente motivada por outro atributo do Hydromedia: Estética! Como eu dizia pro meus gurus lá de Lyon, no Brasil estamos fazendo porque é bonito além de funcional, uma característica pouco explorada na Europa, por exemplo. A textura é interessante as cores são agradáveis e, não atoa, apresentamos pela primeira vez na “Casa Cor”. E se os caros colegas Engenheiros querem uma dica, uma das maneiras mais fáceis de emplacar uma tecnologia nova é convencendo os Arquitetos!


O negócio é resistente, bonito, seguro e pode ser uma grande arma na redução das enchentes de verão, ou pelo menos uma forma de não piora-las ainda mais. Relendo esse post eu preciso confessar que esta mesmo parecendo uma propaganda de produto, o que não é o objetivo do blog. Mas, caramba, eu sou mesmo apaixonado por esse concreto. É um dos que deram mais trabalho, pra  mim, meu parceiro Bruno e outros, mas é um dos mais interessantes. Fazemos tão pouco pela natureza, às vezes acho até que fazemos mais contra que a favor. Então, quando aparece uma oportunidade de fazer a diferença com concreto, a gente acaba se empolgando! Até a próxima.
Continue lendo

sexta-feira, 16 de novembro de 2012

Dosagem de concreto: Teoria e Prática podem coexistir


 
Eu leio muito sobre física. E recentemente li que os físicos costumam se auto dividir, metaforicamente, entre “Gregos” e “Babilônios”. Isso devido à maneira pela qual cada um desses povos clássicos se relacionava com a ciência. Os Babilônios se concentravam nos fenômenos, se permitindo usar o instinto ou a intuição, dispensando o rigor em relação à matemática. Já os Gregos se focavam na ordem por trás dos fenômenos e consideravam que uma coisa era verdade apenas se ela se enquadrasse em um sistema lógico (Mlodnow, Leonard – O Arco-íris de Feynman, 1954). Em outras palavras, os Gregos eram teóricos e os Babilônios eram experimentalistas.
 
 
Gell-Mann e Feynman: O Grego e o Babilônio. Dois Titans da Física
 
Os dois tecnologistas de concreto que mais influenciaram minha forma de trabalhar são, à sua maneira, um bom exemplo desta dicotomia aplicada à engenharia. O primeiro deles é o próprio Babilônio, Gostava de ver o concreto dentro da betoneira e, conforme o desenrolar do experimento, tomar decisões a respeito do traço que irá prevalecer no final das contas. Encarava as surpresas típicas da atividade de laboratório como algo natural e adaptava sua expectativa a esta realidade. Não raro terminávamos o trabalho em uma conclusão completamente diferente do planejamento inicial e uma grande porcentagem das garantias de funcionamento do concreto lá no cliente era creditada ao instinto e à experiência.

 
Tendo “crescido” neste ambiente de liberdade experimental, fui surpreendido pelo estilo Grego do segundo tecnologista que me comandou. Ele traçava uma previsão completa dos resultados de cada experimento, baseada no estrito comportamento matemático esperado para o concreto. E quando, por ventura, os resultados de laboratório divergiam das previsões teóricas, ele decretava que o experimento estava errado e precisava ser repetido. Se por ventura os resultados reais de um determinado grupo de experimentos não representassem os pontos calculados com uma determinada aproximação estatística, eram imediatamente condenados.

 
Distribuição normal de Gauss: Todo resultado experimental esta sugeito à variabilidade estatística e esta associado a um determinado grau de confiabilidade
 
Qual deles é o mais correto? Depois de cinco anos trabalhando com cada um deles, eu cheguei à conclusão que ambos estão muito certos. Voltando a falar de física, podemos buscar dois exemplos onde o excesso de confiança nas predições teóricas ou na qualidade dos experimentos levou a grandes equívocos. No primeiro caso, a devoção de alguns cientistas ao princípio da localidade (entre eles o próprio Einstein) os fez duvidar da validade da mecânica quântica, com seu emaranhamento de partículas. Até os experimentos comprovarem que o mundo permite sim que existam interações entre partículas subatômicas, sem que haja contato direto entre elas. De outro lado, recentemente, um grupo de experimentalistas noticiou para o mundo terem registrado Neutrinos viajando com velocidades superiores à da luz, contrariando o princípio fundamental da Relatividade. Aí descobriu-se que eles mediram a distância percorrida pelos Neutrinos usando GPS, um instrumento baseado nas equações da relatividade, gerando um erro de referência circular: usaram uma medida relativística para contrariar a relatividade!
 
Mas, pedindo perdão pelo indigesto parágrafo acima, a mensagem que eu gostaria de deixar é que eu aprendi a valorizar igualitariamente as duas correntes filosóficas. Em meu método de dosagem eu passei a adotar um sistema iterativo em que as previsões teóricas são usadas para ajustar os resultados de experimentos preliminares, criando um novo modelo matemático para planejar o próximo experimento. Repito este ciclo pelo número necessário de iterações que apresente resultados experimentais estatisticamente coerentes com a previsão anterior. E aí, com as garantias estatísticas a meu favor, tenho então um modelo matemático “ultra – confiável” para definir os traços que serão usados na obra do cliente.
 

Exemplo de uma distribuição exponencial com bom grau de confiabilidade
 
Funciona mais ou menos assim: No concreto, as propriedades e características básicas podem ser inter-relacionadas com alguns parâmetros mais importantes, como o fator água/cimento (a/c) por exemplo. E esse relacionamento pode ser expresso através de uma aproximação, uma tendência exponencial. Por exemplo, se traçamos um gráfico cartesiano com o fato a/c nas abscissas e os resultados de resistência à compressão nas ordenadas, teremos pontos que teoricamente podem ser ligados entre si por uma curva de desenvolvimento exponencial. É a chamada “Curva de Abrams”. Mas o que ocorre, na realidade, é que os pontos nunca ficam exatamente em cima da curva de tendência e há um modo de medir esse “erro”. Quando o erro é muito grande, é só calcular ao contrário, redefinindo cada fator a/c e experimentando novamente no laboratório. Traçado o novo gráfico o erro tende a diminuir muito e, não raro, basta uma única iteração destas para se obter pontos suficientemente próximos da tendência, tornando a função matemática confiável segundo o modelo estatístico.

 
É uma maneira de fazer coexistir a betoneira, o cone de slump e a prensa, com o computador, a planilha e a equação logarítmica. A matemática nos ajuda a evitar os erros de laboratório, criando condições de contorno mais ou menos rigorosas. E o laboratório nos ajuda a reduzir a confiança exacerbada em nosso modelo virtual, mostrando que o mundo real é sujeito a variabilidades. Aí percebemos que a engenharia é na verdade uma saborosa mistura de ciência e arte, onde a liberdade criativa trafega confortavelmente entre os muros traçados pela lógica racional.
Continue lendo
 

Concreto: Propriedades, descobertas e casos interessantes Copyright © 2011 | Template design by O Pregador | Powered by Blogger Templates